20.9.10

Dissidências no sul do Brasil.

((( Escrever sobre a Revolução Farroupilha é uma tarefa que, embora já feita por mim, não me é das mais agradáveis! Confesso não ter paciência para com o brilho e opulência que a festa carrega! E muito menos com os equívocos e invenções do MTG. Assim sendo, cedo espaço ao colega mais talentoso e grande amigo: Willy! Que, curiosamente, abandonou os pampas para viver na Argentina, assim como Bento Gonçalves! Saudades, camarada! )))


Na madrugada do 20 de setembro, em 1835, rebeldes gaúchos da Província de São Pedro, chamados pelos seus rivais políticos de farroupilhas ou farrapos, tomaram o poder destituindo ao governador, nessa época chamado de Presidente.Não era apenas um entrevero mais de caudilhos, acostumados a levantar-se em armas a cada divergência, era uma verdadeira Revolução contra o governo central português. O Império, no seu período regencial, cobrava pesadíssimos impostos para todos os produtos que a Província exportava, em especial o charque - a carne salgada -, que era a base de alimentação dos escravos nos latifúndios do País e onde fosse adotado o sistema escravagista. Ademais de reduzir as taxas de importação do charque do Uruguai e da Argentina que, passou a entrar no país com preço altamente favorável, o governo regencial aumentou internamente as do sal, insumo básico nos saladeiros gaúchos, trazendo prejuízos à economia dos pecuaristas da região. As idéias de autonomia e federalismo ganharam força ao natural na província distanciada do centro do País. A condição de ser um estado produtor de alimentos e a vivência histórica de guerras fez com que a elite rural, com experiência militar e poder suficientes, não se submetesse à imposição de tais impostos escorchantes.
Nessa luta contra o centralismo do Império, se clamava por justiça tributária, ademais de uma maior autonomia econômica e política para as Províncias, até na escolha do próprio presidente, para que o mesmo fosse da terra.

A Guerra dos Farrapos constituiu-se no mais importante rompimento com o Império, dentre vários que houve nesse período. Inclusive os nobres, os barões do café - tradicional base de sustento da economia monárquica -, entenderam o descompasso entre a importância política e o poder econômico, após perderem privilégios monetários e esgotarem as produções nas suas terras. As idéias liberais - que pregoavam a derrubada das monarquias absolutistas percorrendo todo o mundo e o sucesso das Repúblicas da bacia do Prata, foram a base da revolução gaúcha brasileira e das revoltas ditas liberais, como as rebeliões em São Paulo e Minas Gerais e, até, a revolução Praieira em Pernambuco. A Declaração da Independência dos Estados Unidos, em 1776, e os princípios da Revolução Francesa, em 1789, continuavam a encontrar eco nas mentes das novas gerações na América do Sul, sendo modelos para a República que estava nascendo. O líder do movimento farroupilha foi Bento Gonçalves da Silva, que havia participado na guerra contra a Banda Oriental, estancieiro, militar por formação, comandou a insurreição até perto do final em 1845, apoiado pelo grupo chamado de “maioria” das forças revolucionárias, entre eles o ilustre agitador e corsário italiano: Giuseppe Garibaldi. A idéia deste caudilho, apoiada pelas lideranças pecuaristas, era formar uma federação, onde as províncias pudessem congregar-se, sem a incumbência do Império Português. A abolição da escravidão, foi a medida social mais importante tomada pelos gaúchos rebeldes. A proposta - aparentemente libertária – era apenas para os escravos negros que se incorporassem como soldados, tendo como intenção básica, arregimentar as tropas sulinas, em ampla desvantagem numérica em relação às forças imperiais. Muito mais do que um sentimento de igualdade ou liberdade a “libertação” dos negros gaúchos perseguia um interesse bem específico de aumentar o exército farrapo. Entre seus próprios colaboradores, Bento Gonçalves encontrou uma forte resistência, um movimento interno chamado de “minoria”, que em essência pretendia vantagens pessoais e enriquecimento. Este cisma político irá quebrar o espírito revolucionário e acabar com o sonho de independência no sul. Depois de 10 duríssimos e longos anos de luta desigual, em guerra de guerrilhas, os ginetes farroupilhas, ótimos em combate a cavalo, depuseram as armas. Foi realizado um acordo de paz, entre o governo central e os revolucionários gaúchos, uma decisão estratégica que manteve a soberania portuguesa no território e a dignidade - investida de lenço vermelho - do povo riograndense, além do ressarcimento econômico da liderança farrapa. A Revolução Farroupilha continua a fascinar não só a historiadores, que se digladiam sobre a intenção, ou não, de separatismo. Também alimenta o imaginário de aqueles que lutaram e lutam por manter a cultura gaúcha, pugnam pelas tradições, os que querem um Rio Grande do Sul próspero, justo, livre e unido.


Guillermo Burgos - Pesquisador - Pelotas - Rio Grande do Sul - Brasil